quinta-feira, outubro 05, 2017

Já faz um tempo, eu ainda morava em Papucaia e nas vezes em que eu estava no quintal compondo, vinha um pavor, num ímpeto, quando eu sentia que tinha chegado numa música. Quando eu avistava ela e, aí, depois, era só seguir escavando, pra libertar a bichana. Eu ficava bem assustado e ainda fico, quando vejo que posso avistar, destacado do chão, o que fiz e, aí, eu vejo que estou ali, como num espelho.
Isso é uma continuação do que escrevi aqui no Blog Azul, ontem. Sem ser um adendo, porque isso que escrevo agora, tem um outro corpo.
Então, tem pensamento que me deixa bem assustado, por exemplo, isso, pensar que posso ser dois, quando me olho no espelho de uma música que fiz.
Só que, hoje, estávamos falando, eu e Vitor Wutzki, sobre a música Ave Nada. Que é uma música que a cada vez, se mostra de um jeito diferente. Assim, radicalmente diferente. A cada execução dela, seu corpo é outro.
Então, o Vitor tava me dizendo que quando tocamos ela no 171, de BH, ele tinha visto pichada no muro em frente a figura de um peixe-ave. E ele pensou se isso, não era um prenúncio de que fôssemos chegar à Ave Nada definitiva. E para ele, chegamos a uma forma para ela. Mas falta achar o seu miolo, um estofo. Ou, não. E pra sempre ela terá outro e outro recheio.
Essa é uma forma de não ter susto.
De não se ver no espelho.
De não fazer retrato.
Como no post de ontem, de o Diário da Piscina e tudo o mais, ser apenas uma abstração.
Não é ninguém ali.

Ave Nada.

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