sexta-feira, março 18, 2011

Minha referência para escrever o meu último livro, cujo título ficou “Mamãe Me Adora”, foi a doçura do jeito de mamãe e o, para mim, misterioso fato de sua morte. Então, o motivo do “Mamãe Me Adora” tem uma realidade sobre o que nunca tive o menor domínio, porque não se projetaram de mim, mas me advieram, como sementes que se desprendessem da árvore e voassem, caindo para o chão que sou eu.
E daí, brotaram.
Acho que meus livros são sempre assim, se desenvolveram sobre coisas de que não tenho controle, não tenho conhecimento e nem sou eu quem disparo. Eu vinha pensando nisso e pensando que subjacente aos meus temas dos livros vem sempre o tema da homossexualidade.
Já faz tempo trocaram o nome opção sexual para orientação sexual, e penso que isso seja mais de acordo. Por que, se dizem, as bichas burras nascem mortas, nenhum viado teria como escolha ser viado, já que essa é uma condição em que socialmente tem-se levado muito caô. Então, os temas dos livros vêm pra mim e são coisas, tipo, o sol nasce e recebo, simplesmente.
Estive pensando nisso, no ônibus, a caminho da Sala Baden Powell, para o show de Leila Maria(quando entrei no teatro é que descobri que não era show de Leila Maria, mas de uma cantora chamada Clarice, que cantava músicas de Aldir Blanc/ Cristovão Bastos).
Aí, me lembrei da Alexandra que uma vez me perguntou se eu achava que meus livros fariam parte do que se tem chamado ultimamente por literatura gay. E pensei se, como acontece na música, com uma técnica diferente para executar cada gênero musical, se na literatura existiria uma forma diferente para execução de literatura regional, literatura gay, literatura beat, literatura urbana, ficção, biografia e tudo. Ou se o diferença entre os escaninhos literários seria só de conteúdo e não uma diferença técnica, porque cada autor teria sua técnica específica, independente de qual classificação lhe impusessem. Então, Hans Castorp, d’A Montanha Mágica convenceria, absolutamente, independente da técnica empregada para escrever o livro, como personagem gay, bastando que se trocasse a direção de seu amor pela russa Claudia Chauchat, para a direção do italiano Setembrini, e pronto.
E não sei se existe um estudo dizendo como funciona a literatura chamada gay, se, por exemplo, o que chamam de literatura gay teria curvas de raciocínio mais abertas que a literatura heterossexual, ou vice-versa. Ou se os períodos da chamada literatura gay seriam mais curtos, frouxos, ou sei lá, se definissem por uma qualidade típica de, apenas, literatura gay.
Também durante a travessia da ponte meio engarrafada, fiquei imaginando o que Sacramento outro dia me disse: que o Mamãe Me Adora, como todas as outras obras que produzo de forma geral, são, assim, naif. E achei muito justa essa observação, porque se mamãe foi minha referência, era bem legal que o livro lembrasse alguma ingenuidade. E fiquei me lembrando de quando eu comecei a ler o livro em voz alta para mamãe e acabei desistindo, porque o livro, mesmo naif, tem uma complexidade ou elaboração, aparentemente simples, mas que necessita alguma iniciação.
Por isso, ao ler para mamãe, que não era uma leitora de livros, comecei a sentir que aquela linguagem não tava atravessando pra ela e parei. E ela não me cobrou ler outra vez, continuar. E não continuei.
Eu estava pensando nos meus livros e, aí,também lembrei de Rubia, que me disse sobre o movimento artístico contemporâneo europeu denominado pós-pornô e que meus livros poderiam se inserir nessa literatura, que não tem como eixo a heterossexualidade papai e mamãe, mas que muda esse eixo de sexualidade, como dizem, os terremotos mudam o eixo dominante do nosso planeta.
E gostei muito do nome: Pós-pornô.
Fui.

Um comentário:

Evandro Oliveira disse...

Exelente texto, sempre pensei nisso, se existe essa literatura gay? Na verdade acho que existe literatura e como linguagem ela expressa seu tempo, sua vivência, sua invensão, sua memória...
Já falei e vou repetir que sou seu fã.
Bom final de semana e quando der passa lá no blog.